Senhoritos e senhoritas,
Estamos de mudança! O blog está sendo transferido para a plataforma do Wordpress. Aguardo vocês lá. É só ir para www.literarizando.wordpress.com .
Beijinhos!
26.2.09
25.2.09
Uma pausa para dicas de leitura
Olá, foliões arrebentados de tanto pular e não-foliões preguiçosos de tanto descansar!
Hoje não vou deixar nenhum post sobre conteúdo... teremos muito tempo para isso. O que vim deixar aqui são duas dicas de leitura, essas sim, relacionadas com o que discutimos até agora.
A primeira é um livrinho muito interessante chamado "Literatura Brasileira - Modos de Usar", de Luís Augusto Fischer. É um livro de bolso, que faz um panorama geral da nossa literatura e suas principais obras sem o viés historicista que o estudo escolar nos obriga a fazer. Fischer conseguiu fazer nele uma série relações que eu adoraria poder fazer em sala de aula, mas que o sistema escolar como é concebido hoje não me permite. Ele focaliza a nossa produção literária através dos temas, dos gêneros, da relação de (in)dependência da literatura européia e uma série de outras excelentes sacadas.
O outro material é o livro "Novo Mundo - As cartas que batizaram a América". O livro traz as cartas de Américo Vespúcio (e as atribuídas a ele, documentos talvez até mais importante para o imaginário coletivo sobre a América - e o Brasil, principalmente, - do que aqueles historicamente legitimados como sendo suas produções), apresentadas pelo historiador Eduardo Bueno. As notas de apresentação de Eduardo Bueno são interessantíssimas, muito didáticas e - principalmente - deliciosamente bem escritas. Elas nos dão uma dimensão muito clara da dimensão obtida pelos textos de Vespúcio. Em outra ocasião eu vou escrever aqui um pouquinho sobre a Novus Mundus, da qual já lemos um trecho, e não sinto a mínima vergonha de dizer que tudo que aprendi sobre ela veio desse livro.
Ah e não, não estou ganhando comissão para fazer propaganda nenhuma não. É vício de ler mesmo. E vontade de querer alastrar esse vício por aí.
Bom regresso às aulas amanhã!
Beijinhos!!
Hoje não vou deixar nenhum post sobre conteúdo... teremos muito tempo para isso. O que vim deixar aqui são duas dicas de leitura, essas sim, relacionadas com o que discutimos até agora.
A primeira é um livrinho muito interessante chamado "Literatura Brasileira - Modos de Usar", de Luís Augusto Fischer. É um livro de bolso, que faz um panorama geral da nossa literatura e suas principais obras sem o viés historicista que o estudo escolar nos obriga a fazer. Fischer conseguiu fazer nele uma série relações que eu adoraria poder fazer em sala de aula, mas que o sistema escolar como é concebido hoje não me permite. Ele focaliza a nossa produção literária através dos temas, dos gêneros, da relação de (in)dependência da literatura européia e uma série de outras excelentes sacadas.
O outro material é o livro "Novo Mundo - As cartas que batizaram a América". O livro traz as cartas de Américo Vespúcio (e as atribuídas a ele, documentos talvez até mais importante para o imaginário coletivo sobre a América - e o Brasil, principalmente, - do que aqueles historicamente legitimados como sendo suas produções), apresentadas pelo historiador Eduardo Bueno. As notas de apresentação de Eduardo Bueno são interessantíssimas, muito didáticas e - principalmente - deliciosamente bem escritas. Elas nos dão uma dimensão muito clara da dimensão obtida pelos textos de Vespúcio. Em outra ocasião eu vou escrever aqui um pouquinho sobre a Novus Mundus, da qual já lemos um trecho, e não sinto a mínima vergonha de dizer que tudo que aprendi sobre ela veio desse livro.
Ah e não, não estou ganhando comissão para fazer propaganda nenhuma não. É vício de ler mesmo. E vontade de querer alastrar esse vício por aí.
Bom regresso às aulas amanhã!
Beijinhos!!
20.2.09
Quinhentismo - Olhares estrangeiros
Olá, foliões! E não-foliões também, claro!
Eu, aqui, no Carnaval? Claro! Não, não porque eu sou viciada demais em trabalhar. Mas é porque eu adoro carnaval... pra descansar. Juro que apesar de achar uma orquestra de frevo, um caboclo de lança e a batida do maracatu de baque-virado coisas absurdamente emocionantes, até hoje não consegui muito bem processar porque é que ao ver essas coisas nesses quatro dias do ano as pessoas são tomadas por uma crise de euforia súbita. E sim, eu já provei para dizer que não gostei. Mas gosto é gosto, coisa que se discute, mas, principalmente, respeita.
Então deixa eu aproveitar esse tempinho para dar uma atualizada aqui no nosso espaço. O bom é que dá para postar hoje e adiantar uns dois posts na próxima semana. Quem puder vir aqui vai ficar mais que por dentro quando as aulas recomeçarem!
Nesta semana começamos a conversar sobre o Quinhentismo, esse período de produção escrita relativo ao século XVI. Eu, particularmente, tenho uma grande resistência em me referir a ele como um período de produção literária. É que a palavra literária, aqui, tem que ser usada num sentido amplo, como conjunto de obras de uma época (no caso do Quinhentismo brasileiro nem de um país é, já que escreveram muitos estrangeiros de nacionalidades diferentes escreveram sobre nós). Aí, se usarmos a palavra literatura para nos referirmos a ele alguém pode achar que se fala da arte literária. E não é bem isso que aconteceu aqui nos anos quinhentos.
Como vocês perceberam quando leram os excertos dos textos de Pero de Magalhães Gândavo, Pero Vaz de Caminha, Pe. Manuel da Nóbrega e Américo Vespúcio, o principal objetivo da maioria dos textos produzidos nessa época era relatar as viagens ao novo mundo e informar como era a terra e como eram as pessoas encontradas aqui. Não há a preocupação em se conformar, nessas obras, um discurso artístico. Isto não significa, entretanto, que não haja uma preocupação com a linguagem. Só que essa linguagem não tem a intenção de ser artística, mas sim de ser adequada ao relato oficial para um rei ou superior (a maior parte dos textos tinham como destinatário as autoridades da época e muitos deles eram sigilosos, para que não se revelassem as riquezas que poderiam ser cobiçadas pelas nações rivais).
Assumidas então como obras informativas, então, é preciso julgar delas mais o seu conteúdo do que sua expressividade - embora alguns textos tenham um estilo muito peculiar e mereçam receber atenção pelo mérito pessoal de seus autores. E nesse campo do conteúdo, vale salientar dois elementos: o ponto de vista e a verossimilhança.
Produzidos numa perspectiva cultural eurocêntrica, a literatura de informação - os tratados, as cartas, os documentos escritos no Brasil durante o século XVI - pode ser simpática ao Brasil ou assinalar uma profunda crítica ao que se encontrava aqui. A quem se encontrava aqui, para ser mais precisa. A beleza e o exotismo de nossos bens naturais era um consenso entre os cronistas da época. Todos mencionavam a extensão das matas, a diversidade de espécimes animais e vegetais que aqui existiam, os sabores das frutas típicas, o clima - elementos que faziam do lugar um paraíso terreal, quase o Jardim do Éden (daí se falar em um ponto de vista edênico sobre o Brasil). Entretanto, no quesito gente, os textos acabaram sendo mais polêmicos.
Enquanto Portugal não tinha grandes interesses econômicos no Brasil, o que se deu até meados de 1535, os índios e sua cultura foram freqüentemente apresentados como uma população exótica, diferente, mas, ao mesmo tempo, de boa índole, inocente e bela. O costume de andarem nus, repetidamente mencionado nos textos da época, não foi julgado negativamente nos primeiros contatos. O próprio Caminha, na Carta do Achamento, afirma que há nessa atitude dos gentios uma profunda inocência, pois eles mostravam o corpo como quem mostra o rosto.
Aliás, encontrar povos que tinham na nudez uma prática cultural comum, sem qualquer inferência erótica, não foi uma novidade para os portugueses, que já havia muito tempo se relacionavam com as mais diversas etnias africanas - e já exploravam desde esse muito o tráfico de escravos. Embora ainda fosse motivo de estranheza, não era exatamente novidade para os lusos a existência de povos que andavam nus. O que assinalava para eles, naquele momento, é que esses povos - os africanos e os silvícolas - eram atrasados e, portanto, inferiores. Como não havia conflitos de interesses entre índios e portugueses, esse caráter "inferior" ficou implícito e não recebeu maiores considerações.
Quanto, porém, os portugueses passaram a ter profundos interesses econômicos no Brasil e a investir em sua colonização (caso o contrário a França - que não reconhecia a legitimidade do Tratado de Tordesilhas - tomaria o território e suas riquezas), a relação com os indígenas mudou - e o que se escreveu sobre eles também. Povos que mantiveram alianças com os portugueses por quase meio século foram traídos e passaram a ser escravizados. Outros, que já tinham alianças com outros povos europeus (os franceses, principalmente) reforçaram seus combates aos colonizadores. Sem igualdade de condições contra as armas de fogo dos exércitos lusos, os índios foram decaindo, mortos em combate ou em virtude das doenças trazidas pelo homem branco (contra as quais não tinham anticorpos) e da fome (com a perda de homens para a escravidão e com outros tantos direcionados para a guerra, as lavouras iam perdendo seus cultivadores).
Mudando-se a relação com os indígenas, de cooperativa para de rivalidade, a imagem que ele tinha nos escritos também mudou. A organização social, os hábitos, a cultura foram duramente criticados e o índio gentil, inocente e prestativo se tornou violento, libertino e preguiçoso. A suposta ausência de religião e a antropofagia se tornaram os clichês mais constantes na construção de uma imagem de criatura perigosa, que deveria ser "civilizada" - pelo bem ou pela força.
Neste processo de tornar o índio civilizado foi particularmente importante a ação dos padres jesuítas - membros da Companhia de Jesus, ordem missionário responsável pela catequização dos povos encontradas na África e na América do Sul. Entre os muito recursos que eles utilizaram um, muito importante, foi a chamada literatura de catequese. Mas isso são cenas dos próximos capítulos.
Por hoje, fiquem com Deus, aproveitem os quatro dias para pular ou descansar. E juízo, ouviram? Beijinhos e sejam felizes!
Eu, aqui, no Carnaval? Claro! Não, não porque eu sou viciada demais em trabalhar. Mas é porque eu adoro carnaval... pra descansar. Juro que apesar de achar uma orquestra de frevo, um caboclo de lança e a batida do maracatu de baque-virado coisas absurdamente emocionantes, até hoje não consegui muito bem processar porque é que ao ver essas coisas nesses quatro dias do ano as pessoas são tomadas por uma crise de euforia súbita. E sim, eu já provei para dizer que não gostei. Mas gosto é gosto, coisa que se discute, mas, principalmente, respeita.
Então deixa eu aproveitar esse tempinho para dar uma atualizada aqui no nosso espaço. O bom é que dá para postar hoje e adiantar uns dois posts na próxima semana. Quem puder vir aqui vai ficar mais que por dentro quando as aulas recomeçarem!
Nesta semana começamos a conversar sobre o Quinhentismo, esse período de produção escrita relativo ao século XVI. Eu, particularmente, tenho uma grande resistência em me referir a ele como um período de produção literária. É que a palavra literária, aqui, tem que ser usada num sentido amplo, como conjunto de obras de uma época (no caso do Quinhentismo brasileiro nem de um país é, já que escreveram muitos estrangeiros de nacionalidades diferentes escreveram sobre nós). Aí, se usarmos a palavra literatura para nos referirmos a ele alguém pode achar que se fala da arte literária. E não é bem isso que aconteceu aqui nos anos quinhentos.
Como vocês perceberam quando leram os excertos dos textos de Pero de Magalhães Gândavo, Pero Vaz de Caminha, Pe. Manuel da Nóbrega e Américo Vespúcio, o principal objetivo da maioria dos textos produzidos nessa época era relatar as viagens ao novo mundo e informar como era a terra e como eram as pessoas encontradas aqui. Não há a preocupação em se conformar, nessas obras, um discurso artístico. Isto não significa, entretanto, que não haja uma preocupação com a linguagem. Só que essa linguagem não tem a intenção de ser artística, mas sim de ser adequada ao relato oficial para um rei ou superior (a maior parte dos textos tinham como destinatário as autoridades da época e muitos deles eram sigilosos, para que não se revelassem as riquezas que poderiam ser cobiçadas pelas nações rivais).
Assumidas então como obras informativas, então, é preciso julgar delas mais o seu conteúdo do que sua expressividade - embora alguns textos tenham um estilo muito peculiar e mereçam receber atenção pelo mérito pessoal de seus autores. E nesse campo do conteúdo, vale salientar dois elementos: o ponto de vista e a verossimilhança.
Produzidos numa perspectiva cultural eurocêntrica, a literatura de informação - os tratados, as cartas, os documentos escritos no Brasil durante o século XVI - pode ser simpática ao Brasil ou assinalar uma profunda crítica ao que se encontrava aqui. A quem se encontrava aqui, para ser mais precisa. A beleza e o exotismo de nossos bens naturais era um consenso entre os cronistas da época. Todos mencionavam a extensão das matas, a diversidade de espécimes animais e vegetais que aqui existiam, os sabores das frutas típicas, o clima - elementos que faziam do lugar um paraíso terreal, quase o Jardim do Éden (daí se falar em um ponto de vista edênico sobre o Brasil). Entretanto, no quesito gente, os textos acabaram sendo mais polêmicos.
Enquanto Portugal não tinha grandes interesses econômicos no Brasil, o que se deu até meados de 1535, os índios e sua cultura foram freqüentemente apresentados como uma população exótica, diferente, mas, ao mesmo tempo, de boa índole, inocente e bela. O costume de andarem nus, repetidamente mencionado nos textos da época, não foi julgado negativamente nos primeiros contatos. O próprio Caminha, na Carta do Achamento, afirma que há nessa atitude dos gentios uma profunda inocência, pois eles mostravam o corpo como quem mostra o rosto.
Aliás, encontrar povos que tinham na nudez uma prática cultural comum, sem qualquer inferência erótica, não foi uma novidade para os portugueses, que já havia muito tempo se relacionavam com as mais diversas etnias africanas - e já exploravam desde esse muito o tráfico de escravos. Embora ainda fosse motivo de estranheza, não era exatamente novidade para os lusos a existência de povos que andavam nus. O que assinalava para eles, naquele momento, é que esses povos - os africanos e os silvícolas - eram atrasados e, portanto, inferiores. Como não havia conflitos de interesses entre índios e portugueses, esse caráter "inferior" ficou implícito e não recebeu maiores considerações.
Quanto, porém, os portugueses passaram a ter profundos interesses econômicos no Brasil e a investir em sua colonização (caso o contrário a França - que não reconhecia a legitimidade do Tratado de Tordesilhas - tomaria o território e suas riquezas), a relação com os indígenas mudou - e o que se escreveu sobre eles também. Povos que mantiveram alianças com os portugueses por quase meio século foram traídos e passaram a ser escravizados. Outros, que já tinham alianças com outros povos europeus (os franceses, principalmente) reforçaram seus combates aos colonizadores. Sem igualdade de condições contra as armas de fogo dos exércitos lusos, os índios foram decaindo, mortos em combate ou em virtude das doenças trazidas pelo homem branco (contra as quais não tinham anticorpos) e da fome (com a perda de homens para a escravidão e com outros tantos direcionados para a guerra, as lavouras iam perdendo seus cultivadores).
Mudando-se a relação com os indígenas, de cooperativa para de rivalidade, a imagem que ele tinha nos escritos também mudou. A organização social, os hábitos, a cultura foram duramente criticados e o índio gentil, inocente e prestativo se tornou violento, libertino e preguiçoso. A suposta ausência de religião e a antropofagia se tornaram os clichês mais constantes na construção de uma imagem de criatura perigosa, que deveria ser "civilizada" - pelo bem ou pela força.
Neste processo de tornar o índio civilizado foi particularmente importante a ação dos padres jesuítas - membros da Companhia de Jesus, ordem missionário responsável pela catequização dos povos encontradas na África e na América do Sul. Entre os muito recursos que eles utilizaram um, muito importante, foi a chamada literatura de catequese. Mas isso são cenas dos próximos capítulos.
Por hoje, fiquem com Deus, aproveitem os quatro dias para pular ou descansar. E juízo, ouviram? Beijinhos e sejam felizes!
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12.2.09
Porque eu sou do tamanho do que vejo / E não do tamanho da minha altura...
Post que tem como título versos de Alberto Caeiro, um dos alter-egos poéticos do fantástico poeta português Fernando Pessoa... Se preparem, que hoje eu estou inspirada. E não poderia ser diferente. "Para que serve arte, para que serve literatura?" são duas das três perguntinhas que me fazem ter mais ataques de empolgação por segundo quadrado. É segundo quadrado mesmo... Nessas horas, o tempo fica com duas, três, quatro, cinco, mil dimensões diferentes.
A gente pode pensar em mil razões práticas/utilitárias para a existência da arte e para se estudar arte. Podemos dizer que a arte é importante porque é um meio de expressarmos emoções e sentimentos, porque ela é um bem que registra um período cultural no tempo, porque ela é capaz de entreter e dar prazer... Isso só para começar. Para os mais céticos a gente pode dizer que o mercado de trabalho exige cada vez mais um profissional múltiplo, capaz de compreender o mundo a sua volta e por isso é preciso investir numa formação ampla (e repetir aquilo de que vai cair no vestibular).
Ok, são boas respostas. Mas, pra mim, elas limitam tanto a importância da arte e da literatura na nossa vida e na nossa formação! Por quê? Justamente porque são coisas práticas e utilitárias e, embora ser prático seja importante em determinados setores da nossa existência, ser APENAS isso é tão limitador...
Para mim, perguntar "para que serve arte e literatura?" é fazer um questionamento muito próximo, muito parecido com outro, fundamental. "Para quê serve a vida que a gente leva?".
É claro que podemos responder isso de forma objetiva/científica/prática e até religiosa. Mas é tão limitador, não é mesmo? A vida nos foi dada... e o que vamos fazer com ela? Ser práticos e objetivos? Ser APENAS isso?
Justamente porque a arte tem tanto a ver com a emoção e os significados que o ser humano atribui ao seu redor, o que a gente faz com ela e o que fazemos com as nossas vidas são coisas tão próximas. Podemos, por exemplo, pensar que a nossa vida serve (ou deve servir) para que aproveitemos ao máximo os prazeres que o nosso tempo sobre a terra pode nos dar. Ou ainda que deve servir para que participemos de um processo social que constrói riquezas e que nossa vida serve como um ponte entre o que se acumulou de riquezas (na família ou na sociedade em geral) no passado e o que se acumulará no futuro. Podemos, ainda, pensar que a nossa vida é uma coisa tão frágil e insignificante (já que a Terra não parou de girar sobre o próprio eixo quando começamos a existir, nem parará quando deixarmos de existir aqui) que ela não tem significado, não tem "para quê" - e com isso qualquer ação nossa fica sem sentido.
A vida pode ser tudo isso, e a arte vai ter serventia para cada jeito de se perceber o que a vida deve ser. Mas na minha humilde, humilíssima opinião, todas essas respostas acima estão tão limitadas... Eu, particularmente, acho que a vida pode ter cada uma dessas coisas em si: viver envolve usufruir com prazer o que nosso tempo aqui nos oferece, envolve pensarmos em construir um mundo melhor (e nisso riqueza não é apenas uma conquista material por si só) e sim, o mundo não vai parar por nós: por isso temos que ser humildes em reconhecer nossas limitações.
O detalhe é que só se focar nisso nos dá uma idéia tão limitada do que é a vida. É como olhar para um cubo é só enxergar um de seus lados. E por isso, numa postura tão arrogante, que é decretar o que é a vida, quanto humilde, que é reconhecer que essa é uma resposta pessoa e intransferível, eu atrevidamente postulo aqui: a gente está aqui para viver em todas as dimensões que essa vida que a gente pode levar nos oferece. Estamos aqui para, de olhos fechados, sentir o mundo, em suas contradições, seus milagres, suas mazelas, o sol e a chuva açoitando a nossa pele e o vento uivando nos cabelos. Estamos aqui para perceber. Perceber e aprender. Para não passar em branco, apenas vendo a grama ou os dígitos da conta bancária, crescerem.
E é por isso que eu defendo que arte e literatura são coisas muito mais imprescindíveis, às vezes, do que o conhecimento científico.
"Pronto, agora deu! A ciência pode salvar vidas. Uma pessoa doente vai dar importância para livros, pinturas ou para médicos que podem curá-la?"
Eu não disse que a ciência não é importante. Sim, ela pode salvar vidas, pode tornar nossas vidas mais confortáveis também. Esse papel dela é inegável e eu não disse que podemos prescindir de sua existência em nossas vidas. Nem disse que a arte pode substituir a ciência. O que eu afirmei é que existe um papel que a ciência não cumpre, o papel da arte na nossa existência, e que pode sim, às vezes, ser mais necessário para nós do que a cura do corpo ou os benefícios da comunicação por satélite e do transporte mais rápido e mais barato.
Salvar vidas é importante. Mas tão importante, ou mais que isso, é dar sentido a elas. Sentido profundo, pleno. É dar ao homem uma capacidade de se enxergar, e de enxergar o que o cerca, maior e melhor. É limpar os nossos sentidos do comodismo cotidiano e enxergar o mundo sem a inércia que é o costume. Qual foi a última vez que você se permitiu observar as pessoas que te rodeiam e conhecê-las, o que pensam, o que sentem, suas histórias de vida? Quais foram os últimos encontros significativos, desses de alma para alma, dessas conversas que mudam os rumos de uma vida inteira para sempre?
Não é fácil fazer isso no dia a dia. A gente vai para o trabalho, para a escola, entra nos ônibus, paga as contas, presta provas, vai respirando um dia após o outro e esses momentos vão se minguando. E então, de repente, do nada, uma fotografia, uma música, um filme, uma peça, um poema, um livro entram na nossa vida e nós conhecemos o seu universo e as pessoas que os compõem mais profundamente do que o irmão que bagunça o hd do nosso computador. E conseguimos isso, principalmente, quando lemos. Ali entramos profundamente no que pensam e no que sentem Aurélia, Bella, Sargento Garcia, Sherlock, Peri, a mulher do médico, Fabiano, a cachorra Baleia. Eles nos emocionam. Eles nos tocam. Entram na nossa vida, e com raiva, com asco, com carinho, sua trajetória fica impregnada em nós.
Não sou eu que estou inventando essa relação. Aristóteles, o filósofo grego, falou disso há uns mil e muitos anos atrás. Ele chamou a isso de catarse: a projeção e a expiação de nossos sentimentos através de uma obra de arte. A catarse é aquele alívio que Link (e nós, junto com ele) sente no fim da sequência em que Neo vai voando (literalmente) salvar Trinity em Matrix Reloaded. É a catarse que faz com que a gente se contorça, nos filmes de terror, quando sabe que a mocinha tinha que fugir pela porta da frente e não subir pelas escadas. É ela que faz com que a gente chame Aurélia Camargo de burra cada vez que ela pisa em Fernando Seixas - e o chame de três vezes burro porque só ele não percebe que ela faz tudo aquilo porque o ama profundamente e quer ter certeza de que é correspondida. A catarse é esse chorar junto com o personagem, essa profunda identificação com o que há de humano nele e que nos faz sair da obra cansados, mas renovados, mais leves, prontos para enfrentar, de novo, o dia a dia, as contas, as provas e o dizer "bom dia", "boa tarde" a pessoas que não conhecemos.
Para que serve a arte? Para sermos maiores. É o que o Pessoa, na voz de Alberto Caeiro, nos disse. Nós somos do tamanho do que conseguimos enxergar. E a arte, a literatura, nos retira dessa cegueira do cotidiano, nos lembra como é estar vivos, e sentir, e sonhar, e amar.
Para quê serve viver? Para sentir o mundo, profundamente, e enxergá-lo com vastidão. Senão, a nossa vida, torna-se o que chamamos, metaforicamente, de uma página em branco.
Para que serve arte e literatura? Para nos fazer sentir o mundo, profundamente, e enxergá-lo com vastidão. Para que não fiquemos mecanizados, autômatos e inumanos, esperando da vida apenas aquilo que é causa e consequência, razão, linearidade. Para nos lembrar do que é ser humano.
Nós somos do tamanho do que vemos, e não do tamanho da nossa altura. O mundo de cada um de nós é do tamanho daquilo que conseguimos enxergar. Do que conseguimos ler. Por isso que Monteiro Lobato afirmou, muito claramente: "Os livros não mudam o mundo. Os livros mudam as pessoas. As pessoas é que mudam o mundo".
Eu avisei que ia me empolgar, não avisei? Avisei sim. E quanto às multidimensões do tempo: você acabou de viver uma delas. Você me leu. O tempo meu, de agora, quando escrevi, é tempo passado seu. Mas é tempo presente, ao mesmo tempo. Nosso tempo se elevou, agora, em dois. O meu e o seu. O texto é a primeira máquina do tempo inventada pelo homem. E a única que oferece viagens sem riscos.
O post já está grande e a minha adrenalina baixou. Espero ter conseguido escrever com a clareza que eu gostaria que esse texto tivesse/tenha. Se não consegui, conheço alguém mais competente do que eu para dizer, em outras palavras, o que eu tentei aqui. É o escritor brasileiro Otto Lara Resende, em sua crônica Vista cansada. Fiquem com ele!
Um beijo no coração, com muito carinho.
E não esqueçam: vejam.
Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa idéia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.
Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.
Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima idéia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.
Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.
A gente pode pensar em mil razões práticas/utilitárias para a existência da arte e para se estudar arte. Podemos dizer que a arte é importante porque é um meio de expressarmos emoções e sentimentos, porque ela é um bem que registra um período cultural no tempo, porque ela é capaz de entreter e dar prazer... Isso só para começar. Para os mais céticos a gente pode dizer que o mercado de trabalho exige cada vez mais um profissional múltiplo, capaz de compreender o mundo a sua volta e por isso é preciso investir numa formação ampla (e repetir aquilo de que vai cair no vestibular).
Ok, são boas respostas. Mas, pra mim, elas limitam tanto a importância da arte e da literatura na nossa vida e na nossa formação! Por quê? Justamente porque são coisas práticas e utilitárias e, embora ser prático seja importante em determinados setores da nossa existência, ser APENAS isso é tão limitador...
Para mim, perguntar "para que serve arte e literatura?" é fazer um questionamento muito próximo, muito parecido com outro, fundamental. "Para quê serve a vida que a gente leva?".
É claro que podemos responder isso de forma objetiva/científica/prática e até religiosa. Mas é tão limitador, não é mesmo? A vida nos foi dada... e o que vamos fazer com ela? Ser práticos e objetivos? Ser APENAS isso?
Justamente porque a arte tem tanto a ver com a emoção e os significados que o ser humano atribui ao seu redor, o que a gente faz com ela e o que fazemos com as nossas vidas são coisas tão próximas. Podemos, por exemplo, pensar que a nossa vida serve (ou deve servir) para que aproveitemos ao máximo os prazeres que o nosso tempo sobre a terra pode nos dar. Ou ainda que deve servir para que participemos de um processo social que constrói riquezas e que nossa vida serve como um ponte entre o que se acumulou de riquezas (na família ou na sociedade em geral) no passado e o que se acumulará no futuro. Podemos, ainda, pensar que a nossa vida é uma coisa tão frágil e insignificante (já que a Terra não parou de girar sobre o próprio eixo quando começamos a existir, nem parará quando deixarmos de existir aqui) que ela não tem significado, não tem "para quê" - e com isso qualquer ação nossa fica sem sentido.
A vida pode ser tudo isso, e a arte vai ter serventia para cada jeito de se perceber o que a vida deve ser. Mas na minha humilde, humilíssima opinião, todas essas respostas acima estão tão limitadas... Eu, particularmente, acho que a vida pode ter cada uma dessas coisas em si: viver envolve usufruir com prazer o que nosso tempo aqui nos oferece, envolve pensarmos em construir um mundo melhor (e nisso riqueza não é apenas uma conquista material por si só) e sim, o mundo não vai parar por nós: por isso temos que ser humildes em reconhecer nossas limitações.
O detalhe é que só se focar nisso nos dá uma idéia tão limitada do que é a vida. É como olhar para um cubo é só enxergar um de seus lados. E por isso, numa postura tão arrogante, que é decretar o que é a vida, quanto humilde, que é reconhecer que essa é uma resposta pessoa e intransferível, eu atrevidamente postulo aqui: a gente está aqui para viver em todas as dimensões que essa vida que a gente pode levar nos oferece. Estamos aqui para, de olhos fechados, sentir o mundo, em suas contradições, seus milagres, suas mazelas, o sol e a chuva açoitando a nossa pele e o vento uivando nos cabelos. Estamos aqui para perceber. Perceber e aprender. Para não passar em branco, apenas vendo a grama ou os dígitos da conta bancária, crescerem.
E é por isso que eu defendo que arte e literatura são coisas muito mais imprescindíveis, às vezes, do que o conhecimento científico.
"Pronto, agora deu! A ciência pode salvar vidas. Uma pessoa doente vai dar importância para livros, pinturas ou para médicos que podem curá-la?"
Eu não disse que a ciência não é importante. Sim, ela pode salvar vidas, pode tornar nossas vidas mais confortáveis também. Esse papel dela é inegável e eu não disse que podemos prescindir de sua existência em nossas vidas. Nem disse que a arte pode substituir a ciência. O que eu afirmei é que existe um papel que a ciência não cumpre, o papel da arte na nossa existência, e que pode sim, às vezes, ser mais necessário para nós do que a cura do corpo ou os benefícios da comunicação por satélite e do transporte mais rápido e mais barato.
Salvar vidas é importante. Mas tão importante, ou mais que isso, é dar sentido a elas. Sentido profundo, pleno. É dar ao homem uma capacidade de se enxergar, e de enxergar o que o cerca, maior e melhor. É limpar os nossos sentidos do comodismo cotidiano e enxergar o mundo sem a inércia que é o costume. Qual foi a última vez que você se permitiu observar as pessoas que te rodeiam e conhecê-las, o que pensam, o que sentem, suas histórias de vida? Quais foram os últimos encontros significativos, desses de alma para alma, dessas conversas que mudam os rumos de uma vida inteira para sempre?
Não é fácil fazer isso no dia a dia. A gente vai para o trabalho, para a escola, entra nos ônibus, paga as contas, presta provas, vai respirando um dia após o outro e esses momentos vão se minguando. E então, de repente, do nada, uma fotografia, uma música, um filme, uma peça, um poema, um livro entram na nossa vida e nós conhecemos o seu universo e as pessoas que os compõem mais profundamente do que o irmão que bagunça o hd do nosso computador. E conseguimos isso, principalmente, quando lemos. Ali entramos profundamente no que pensam e no que sentem Aurélia, Bella, Sargento Garcia, Sherlock, Peri, a mulher do médico, Fabiano, a cachorra Baleia. Eles nos emocionam. Eles nos tocam. Entram na nossa vida, e com raiva, com asco, com carinho, sua trajetória fica impregnada em nós.
Não sou eu que estou inventando essa relação. Aristóteles, o filósofo grego, falou disso há uns mil e muitos anos atrás. Ele chamou a isso de catarse: a projeção e a expiação de nossos sentimentos através de uma obra de arte. A catarse é aquele alívio que Link (e nós, junto com ele) sente no fim da sequência em que Neo vai voando (literalmente) salvar Trinity em Matrix Reloaded. É a catarse que faz com que a gente se contorça, nos filmes de terror, quando sabe que a mocinha tinha que fugir pela porta da frente e não subir pelas escadas. É ela que faz com que a gente chame Aurélia Camargo de burra cada vez que ela pisa em Fernando Seixas - e o chame de três vezes burro porque só ele não percebe que ela faz tudo aquilo porque o ama profundamente e quer ter certeza de que é correspondida. A catarse é esse chorar junto com o personagem, essa profunda identificação com o que há de humano nele e que nos faz sair da obra cansados, mas renovados, mais leves, prontos para enfrentar, de novo, o dia a dia, as contas, as provas e o dizer "bom dia", "boa tarde" a pessoas que não conhecemos.
Para que serve a arte? Para sermos maiores. É o que o Pessoa, na voz de Alberto Caeiro, nos disse. Nós somos do tamanho do que conseguimos enxergar. E a arte, a literatura, nos retira dessa cegueira do cotidiano, nos lembra como é estar vivos, e sentir, e sonhar, e amar.
Para quê serve viver? Para sentir o mundo, profundamente, e enxergá-lo com vastidão. Senão, a nossa vida, torna-se o que chamamos, metaforicamente, de uma página em branco.
Para que serve arte e literatura? Para nos fazer sentir o mundo, profundamente, e enxergá-lo com vastidão. Para que não fiquemos mecanizados, autômatos e inumanos, esperando da vida apenas aquilo que é causa e consequência, razão, linearidade. Para nos lembrar do que é ser humano.
Nós somos do tamanho do que vemos, e não do tamanho da nossa altura. O mundo de cada um de nós é do tamanho daquilo que conseguimos enxergar. Do que conseguimos ler. Por isso que Monteiro Lobato afirmou, muito claramente: "Os livros não mudam o mundo. Os livros mudam as pessoas. As pessoas é que mudam o mundo".
Eu avisei que ia me empolgar, não avisei? Avisei sim. E quanto às multidimensões do tempo: você acabou de viver uma delas. Você me leu. O tempo meu, de agora, quando escrevi, é tempo passado seu. Mas é tempo presente, ao mesmo tempo. Nosso tempo se elevou, agora, em dois. O meu e o seu. O texto é a primeira máquina do tempo inventada pelo homem. E a única que oferece viagens sem riscos.
O post já está grande e a minha adrenalina baixou. Espero ter conseguido escrever com a clareza que eu gostaria que esse texto tivesse/tenha. Se não consegui, conheço alguém mais competente do que eu para dizer, em outras palavras, o que eu tentei aqui. É o escritor brasileiro Otto Lara Resende, em sua crônica Vista cansada. Fiquem com ele!
Um beijo no coração, com muito carinho.
E não esqueçam: vejam.
Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa idéia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.
Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.
Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima idéia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.
Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.
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8.2.09
O que é arte?
Eita perguntinha difícil essa hein? Por mais que tentemos estipular critérios objetivos "arte é uma criação do homem para expressar seus sentimentos", "arte é uma expressão de sentimentos que usa cores, sons, formas, palavras", "arte é uma técnica que busca expressar um ponto de vista estético", vai ter pelo menos um momento em que eles não vão ser suficientes para exprimir o que danado é arte, o que torna um objeto artístico. Basta um artista fazer algo completamente original pra gente se perguntar se aquilo é arte e as opiniões se dividirem.
Ao mesmo tempo, a gente não pode considerar que o conceito de arte é uma coisa completamente subjetiva. Um colar feito por um artesão pode ser compreendido como arte por quem compra e não por quem faz, mas não é nem quem compra nem quem faz que termina definindo o que é arte. Não somente. Esse conceito de obra de arte é uma coisa socializada. Não adiantava Van Gogh achar que os seus quadros eram arte e ter uns dois ou três admiradores. Enquanto ele estava vivo, aquilo não foi arte, pelo menos não arte de valor. Virou depois que alguém, alguém que a sociedade reputava como uma pessoa importante e com capacidade para avaliar o que era arte (e principalmente, o que era arte de valor) não só disse que o que Van Gogh fez era arte, como, principalmente, conseguiu contaminar as outras pessoas com aquela ideia (valeu por me lembrar da ortografia nova, Marina!). O que significa que "o que é arte?" é um conceito que é mais cultural e temporal do que subjetivo. E é por isso que certos artistas são muito valorizados em algumas épocas e depois são deixados de lado e com outros acontece o contrário. No caso dos primeiros, o que eles produziram atendeu às expectativas da sociedade contemporânea a ele, mas, algum tempo depois, essa sociedade mudou, o gosto também, e ele não acompanhou. No caso dos segundos, aconteceu o inverso.
Bom, quando eu levantei essa discussão com vocês, em sala, era justamente para observarmos como esse processo definidor do que é arte ou não é uma coisa relativa e como ele está ligado a uma espécie de cultura da arte ou indústria da arte. Eu prefiro usar cultura da arte porque o termo indústria meio que pressupõe uma perspectiva negativa. Tanto que a gente usa "indústria cinematográfica" ou "indústria musical" para falar dos interesses econômicos que envolvem a produção de cinema e de música em determinado lugar. Por isso, vamos usar cultura da arte quando nos referirmos ao modo como a sociedade encara o que é e o que não é arte ao longo do tempo, ok?
Por hoje eu vou ficar aqui. E já adianto o assunto da próxima postagem: o que é literatura e para que ela pode servir. Tenho certeza de que essa segunda pergunta é a que a maioria se fez quando viu a lista de matérias do Ensino Médio. Na próxima visita, a gente conversa sobre isso. Beijos para vocês!
PS - Como eu desejo muito que sejam felizes, sejam mais felizes com esse Van Gogh (para ver em tamanho grande, com a imagem definida - fica distorcida aqui, em baixa resolução - é só clickar em cima), um dos muitos artistas incompreendidos em seu tempo! Observe o movimento que ele dá para a cena só com uma força maior nas pinceladas. Eu adoroooooo!
Ao mesmo tempo, a gente não pode considerar que o conceito de arte é uma coisa completamente subjetiva. Um colar feito por um artesão pode ser compreendido como arte por quem compra e não por quem faz, mas não é nem quem compra nem quem faz que termina definindo o que é arte. Não somente. Esse conceito de obra de arte é uma coisa socializada. Não adiantava Van Gogh achar que os seus quadros eram arte e ter uns dois ou três admiradores. Enquanto ele estava vivo, aquilo não foi arte, pelo menos não arte de valor. Virou depois que alguém, alguém que a sociedade reputava como uma pessoa importante e com capacidade para avaliar o que era arte (e principalmente, o que era arte de valor) não só disse que o que Van Gogh fez era arte, como, principalmente, conseguiu contaminar as outras pessoas com aquela ideia (valeu por me lembrar da ortografia nova, Marina!). O que significa que "o que é arte?" é um conceito que é mais cultural e temporal do que subjetivo. E é por isso que certos artistas são muito valorizados em algumas épocas e depois são deixados de lado e com outros acontece o contrário. No caso dos primeiros, o que eles produziram atendeu às expectativas da sociedade contemporânea a ele, mas, algum tempo depois, essa sociedade mudou, o gosto também, e ele não acompanhou. No caso dos segundos, aconteceu o inverso.
Bom, quando eu levantei essa discussão com vocês, em sala, era justamente para observarmos como esse processo definidor do que é arte ou não é uma coisa relativa e como ele está ligado a uma espécie de cultura da arte ou indústria da arte. Eu prefiro usar cultura da arte porque o termo indústria meio que pressupõe uma perspectiva negativa. Tanto que a gente usa "indústria cinematográfica" ou "indústria musical" para falar dos interesses econômicos que envolvem a produção de cinema e de música em determinado lugar. Por isso, vamos usar cultura da arte quando nos referirmos ao modo como a sociedade encara o que é e o que não é arte ao longo do tempo, ok?
Por hoje eu vou ficar aqui. E já adianto o assunto da próxima postagem: o que é literatura e para que ela pode servir. Tenho certeza de que essa segunda pergunta é a que a maioria se fez quando viu a lista de matérias do Ensino Médio. Na próxima visita, a gente conversa sobre isso. Beijos para vocês!
PS - Como eu desejo muito que sejam felizes, sejam mais felizes com esse Van Gogh (para ver em tamanho grande, com a imagem definida - fica distorcida aqui, em baixa resolução - é só clickar em cima), um dos muitos artistas incompreendidos em seu tempo! Observe o movimento que ele dá para a cena só com uma força maior nas pinceladas. Eu adoroooooo!
2.2.09
"Mestre é aquele que de repente, aprende" -- Guimarães Rosa
E aí, pessoas? Tudo bem com vocês? Sejam bem-vindos (eu juro que vou me policiar com a ortografia nova, mas ensinar truque novo pra cachorro velho é uma coisa meio delicada, tá? Paciência comigo, por favor...)!
Quando eu digo sejam bem-vindos é sincero. Não é aquele "bom dia" que a gente dá às 6:40 no elevador no primeiro dia de aula, morrendo de sono e de esganar o infeliz que decretou o fim das férias e do sono até as 10:30. Pode parecer estranho, mas eu realmente fico muito feliz com a presença de vocês, aqui, nesse cantinho virtual e em sala de aula. E fico feliz com a presença de cada um, dos cdfs que gostam de ler, que curtem "Sociedade dos Poetas Mortos" (também AMOO) até a galera da swingueira que gosta é mesmo de agitação. É verdade! E vou explicar por quê.
Sabe aquele recadinho da Madre Teresa no texto das duas primeiras aulas de hoje? "A mais bela distração? O trabalho". Eu disse isso pro 1º B, que me aturou hoje por três aulas seguidas, e repito: é verdade! Quando você faz o que você ama, não vê o tempo passar, não quer que ele passe. E eu amo ensinar. Amo estar com vocês (mesmo quando aluno me azucrina o juízo - sempre tem um dia em que alguém azucrina o juízo... faz parte).
Não vou mentir que foi sempre assim. Porque quando eu comecei, há muitos e muitos anos (precisa dizer quantos não, né? Que bom!), eu amava era a minha disciplina. Eu amava Literatura. Como amo, profundamente, até hoje.
E amar a disciplina, não é amar ensinar. São coisas diferentes. Porque existem amores diferentes, sabe? Existem alguns que surgem de repente, no primeiro olhar. E eu digo que o meu amor pela Literatura é assim. É um amor que é uma paixão. E paixão e amor, embora sejam dois sentimentos maravilhosos, eles têm diferenças. Não é uma questão de maior nem mais fundo... É uma questão de aceitação.
Quando a gente se apaixona por uma coisa, por alguém, dificilmente a nossa entrega é completa. Tanto que apaixonado briga que só a peste! Apaixonado, quando descobre o defeito do outro, geralmente se decepciona, briga com ele, faz cara feia. E eu e a Literatura temos um pouquinho disso, eu com ela, na verdade. Tem coisa de que eu não gosto, tem coisa que eu amo profundamente e tem coisa em Literatura que nem arte eu acho que é (essa é uma discussão pra depois, tá?). É aquela paixão que vira a cara pra certas coisas, briga e depois liga chorando pedindo pra fazer as pazes. E fica tudo bem até dar de cara com aquele defeitinho de novo.
Com ensinar já foi assim. Hoje está ficando cada vez mais diferente. Eu fui aprendendo a amar ensinar e aí eu comparo com aquele amor maior. Aquele daqueles casais já idosos, que passaram a vida toda juntos, que conhecem cada defeito, cada qualidade, cada expressão de olhar do outro. E que estão um do lado do outro, sempre. Com ensinar foi assim. O amor foi surgindo da convivência, da experiência, no dia a dia. Ensinar tem muitos defeitos, muitas dificuldades, para ser bem clara. A gente se debate com a pressão de ensinar coisas que acha que não deviam ser priorizadas, ensinar para gente que, porque não quer se abrir para o mundo, acha que deve marcar sua rebeldia destratando ou desrespeitando... A gente se debate com uma cultura que diz que a educação deve ser utilitária... Que a gente deve aprender coisas porque elas são importantes para a profissão, e, consequentemente, para a sobrevivência e só por isso se deve aprendê-las. Ou que é o que precisa para passar de ano, então basta aprender para passar na prova final.
Ser professor, hoje, no Brasil, é bem complicadinho. Mas eu aprendi a amar ser professora. Aprendi a amar ser EDUCADORA. Eu aprendi a conviver com todas essas coisas com paciência, porque olhando o todo eu vejo nele uma beleza que me fascina. Eu vejo que em fevereiro me é dado o direito de conviver com pessoas que, de uma forma ou de outra, não são mais as mesmas em dezembro. Eu vejo a vida em transformação bem na minha frente, às vezes, por pequenas coisas, na palma da minha mão. Como quem consegue observar os minutos exatos de um casulo que se abre e em que a borboleta enxuga as asas. Às vezes dá até para ver as borboletas voarem.
E isso eu não aprendi sozinha. Raramente a gente aprende algo só. A gente aprende de repente, talvez, mas não só. Alguém, mesmo sem saber, mostra as coisas e às vezes sem saber também, a gente imita. Como criança pequena que imita pai e mãe.
Quem me ensinou a amar ensinar, a amar educar, foram os meus alunos. Os tantos pequenos milhares com quem tive o privilégio de conviver. E foram todos eles... As patricinhas maquiadas, os nerds, a galera da política, os palhaços, as almas sebosas, os dorminhocos, os esquecidos, os atletas, as meninas da dança, os atrasados, os emos, os forrozeiros, alvi-rubros, rubro-negros, tricolores, real-madrileños (se é que é assim que se chama)...
Por isso, quando eu digo bem-vindos, eu digo de coração e de sorriso aberto. Ter vocês na minha vida é um motivo de muita alegria. Eu acabei de ganhar novos professores, que me re-ensinam, todos os dias, coisas importantes como amizade, companheirismo, determinação, acolhida, carinho. Obrigada por aquilo que eu sei que vocês vão me ensinar este ano.
E para terminar, como não poderia deixar de ser, afinal este é um espaço para Literarizar a vida, transformar tudo em literatura, vou deixar com vocês um trechinho de algo que eu gosto muito. Espero que vocês gostem também!
Um xêro!
No silêncio da noite, caminhei em vossas ruas, e meu espírito entrou em vossas casas,
E vossos corações bateram em meu coração, e vosso hálito soprou sobre a minha face, e eu conheci todos vós.
Sim, conheci vossa alegria e vossa dor, e em vossos sonos, vossos sonhos foram meus sonhos.
E muitas vezes estive entre vós, como um lago entre as montanhas.
Refleti os picos em vós, e as encostas íngremes, e até mesmo os rebanhos de vossos pensamentos e vossos desejos.
E ao meu silêncio, chegou o riso de vossos filhos em riachos, e o desejo de vossos jovens em rios.
E quando chegaram a mim, os riachos e os rios não cessaram de cantar.
Mas ainda mais doce que o riso e maior que o desejo, veio a mim
O que era ilimitado em vós;
O vasto homem, dentro do qual sois apenas celas e força;
Ele, em cujo cântico todo o vosso cantar é apenas pulsar silencioso.
É neste vasto homem que sois vastos,
E foi contemplando-o que contemplei a vós e vos amei.
(...)
Dei menos que uma promessa, mas vós fostes ainda mais generosos.
me destes minha profunda sede de vida.
Certamente, não há presente maior para um homem do que aquele que transforma todos os seus objetivos em lábios sedentos e toda a vida em uma fonte.
E nisto está minha honraria e minha recompensa -
Quando venho à fonte para beber, encontro a própria água, viva e sedenta:
E ela bebe a mim enquanto eu a bebo
Gibran Khalil Gibran, O profeta
Quando eu digo sejam bem-vindos é sincero. Não é aquele "bom dia" que a gente dá às 6:40 no elevador no primeiro dia de aula, morrendo de sono e de esganar o infeliz que decretou o fim das férias e do sono até as 10:30. Pode parecer estranho, mas eu realmente fico muito feliz com a presença de vocês, aqui, nesse cantinho virtual e em sala de aula. E fico feliz com a presença de cada um, dos cdfs que gostam de ler, que curtem "Sociedade dos Poetas Mortos" (também AMOO) até a galera da swingueira que gosta é mesmo de agitação. É verdade! E vou explicar por quê.
Sabe aquele recadinho da Madre Teresa no texto das duas primeiras aulas de hoje? "A mais bela distração? O trabalho". Eu disse isso pro 1º B, que me aturou hoje por três aulas seguidas, e repito: é verdade! Quando você faz o que você ama, não vê o tempo passar, não quer que ele passe. E eu amo ensinar. Amo estar com vocês (mesmo quando aluno me azucrina o juízo - sempre tem um dia em que alguém azucrina o juízo... faz parte).
Não vou mentir que foi sempre assim. Porque quando eu comecei, há muitos e muitos anos (precisa dizer quantos não, né? Que bom!), eu amava era a minha disciplina. Eu amava Literatura. Como amo, profundamente, até hoje.
E amar a disciplina, não é amar ensinar. São coisas diferentes. Porque existem amores diferentes, sabe? Existem alguns que surgem de repente, no primeiro olhar. E eu digo que o meu amor pela Literatura é assim. É um amor que é uma paixão. E paixão e amor, embora sejam dois sentimentos maravilhosos, eles têm diferenças. Não é uma questão de maior nem mais fundo... É uma questão de aceitação.
Quando a gente se apaixona por uma coisa, por alguém, dificilmente a nossa entrega é completa. Tanto que apaixonado briga que só a peste! Apaixonado, quando descobre o defeito do outro, geralmente se decepciona, briga com ele, faz cara feia. E eu e a Literatura temos um pouquinho disso, eu com ela, na verdade. Tem coisa de que eu não gosto, tem coisa que eu amo profundamente e tem coisa em Literatura que nem arte eu acho que é (essa é uma discussão pra depois, tá?). É aquela paixão que vira a cara pra certas coisas, briga e depois liga chorando pedindo pra fazer as pazes. E fica tudo bem até dar de cara com aquele defeitinho de novo.
Com ensinar já foi assim. Hoje está ficando cada vez mais diferente. Eu fui aprendendo a amar ensinar e aí eu comparo com aquele amor maior. Aquele daqueles casais já idosos, que passaram a vida toda juntos, que conhecem cada defeito, cada qualidade, cada expressão de olhar do outro. E que estão um do lado do outro, sempre. Com ensinar foi assim. O amor foi surgindo da convivência, da experiência, no dia a dia. Ensinar tem muitos defeitos, muitas dificuldades, para ser bem clara. A gente se debate com a pressão de ensinar coisas que acha que não deviam ser priorizadas, ensinar para gente que, porque não quer se abrir para o mundo, acha que deve marcar sua rebeldia destratando ou desrespeitando... A gente se debate com uma cultura que diz que a educação deve ser utilitária... Que a gente deve aprender coisas porque elas são importantes para a profissão, e, consequentemente, para a sobrevivência e só por isso se deve aprendê-las. Ou que é o que precisa para passar de ano, então basta aprender para passar na prova final.
Ser professor, hoje, no Brasil, é bem complicadinho. Mas eu aprendi a amar ser professora. Aprendi a amar ser EDUCADORA. Eu aprendi a conviver com todas essas coisas com paciência, porque olhando o todo eu vejo nele uma beleza que me fascina. Eu vejo que em fevereiro me é dado o direito de conviver com pessoas que, de uma forma ou de outra, não são mais as mesmas em dezembro. Eu vejo a vida em transformação bem na minha frente, às vezes, por pequenas coisas, na palma da minha mão. Como quem consegue observar os minutos exatos de um casulo que se abre e em que a borboleta enxuga as asas. Às vezes dá até para ver as borboletas voarem.
E isso eu não aprendi sozinha. Raramente a gente aprende algo só. A gente aprende de repente, talvez, mas não só. Alguém, mesmo sem saber, mostra as coisas e às vezes sem saber também, a gente imita. Como criança pequena que imita pai e mãe.
Quem me ensinou a amar ensinar, a amar educar, foram os meus alunos. Os tantos pequenos milhares com quem tive o privilégio de conviver. E foram todos eles... As patricinhas maquiadas, os nerds, a galera da política, os palhaços, as almas sebosas, os dorminhocos, os esquecidos, os atletas, as meninas da dança, os atrasados, os emos, os forrozeiros, alvi-rubros, rubro-negros, tricolores, real-madrileños (se é que é assim que se chama)...
Por isso, quando eu digo bem-vindos, eu digo de coração e de sorriso aberto. Ter vocês na minha vida é um motivo de muita alegria. Eu acabei de ganhar novos professores, que me re-ensinam, todos os dias, coisas importantes como amizade, companheirismo, determinação, acolhida, carinho. Obrigada por aquilo que eu sei que vocês vão me ensinar este ano.
E para terminar, como não poderia deixar de ser, afinal este é um espaço para Literarizar a vida, transformar tudo em literatura, vou deixar com vocês um trechinho de algo que eu gosto muito. Espero que vocês gostem também!
Um xêro!
No silêncio da noite, caminhei em vossas ruas, e meu espírito entrou em vossas casas,
E vossos corações bateram em meu coração, e vosso hálito soprou sobre a minha face, e eu conheci todos vós.
Sim, conheci vossa alegria e vossa dor, e em vossos sonos, vossos sonhos foram meus sonhos.
E muitas vezes estive entre vós, como um lago entre as montanhas.
Refleti os picos em vós, e as encostas íngremes, e até mesmo os rebanhos de vossos pensamentos e vossos desejos.
E ao meu silêncio, chegou o riso de vossos filhos em riachos, e o desejo de vossos jovens em rios.
E quando chegaram a mim, os riachos e os rios não cessaram de cantar.
Mas ainda mais doce que o riso e maior que o desejo, veio a mim
O que era ilimitado em vós;
O vasto homem, dentro do qual sois apenas celas e força;
Ele, em cujo cântico todo o vosso cantar é apenas pulsar silencioso.
É neste vasto homem que sois vastos,
E foi contemplando-o que contemplei a vós e vos amei.
(...)
Dei menos que uma promessa, mas vós fostes ainda mais generosos.
me destes minha profunda sede de vida.
Certamente, não há presente maior para um homem do que aquele que transforma todos os seus objetivos em lábios sedentos e toda a vida em uma fonte.
E nisto está minha honraria e minha recompensa -
Quando venho à fonte para beber, encontro a própria água, viva e sedenta:
E ela bebe a mim enquanto eu a bebo
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