18.10.07

Análise de poemas

Fofinhos,

Como eu prometi, vou deixar, além da análise do poema de Gonçalves Dias Leito de folhas verdes, que foi na ficha 9, vou deixar um exemplo de análise de poema para vocês aqui. Espero que aproveitem não só a ajuda para terminarem o trabalho mas também curtam o texto!

Teresa
Manuel Bandeira

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo
.............................................................................................[nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

O poema Teresa, de Manuel Bandeira, faz parte do livro Libertinagem, o primeiro livro modernista do autor. Trata-se de um texto lírico-amoroso em que é narrada a descoberta amorosa da personagem do título pelo eu lírico. Esta descoberta acontece de forma banal, sem os arroubos de paixão romântica, o que quebra a expectativa do leitor de encontrar um grande história de paixão à primeira vista ou de encontrar uma grande musa por quem, mais à frente, o eu lírico irá se apaixonar.

Teresa, para o eu lírico, à primeira vista, parece burra. Burra, pois a cara parecia uma perna, compara o autor, um perna estúpida, ou seja, grosseira, inexpressiva. Depois, no entanto, o olhar sobre Teresa se aprofunda: é um olhar que investiga o olhar. O eu lírico olha no fundo dos olhos de Teresa, e enxega Teresa além da perna. Teresa tem olhos velhos, e enxergar a alma velha dentro dos olhos não só denota um interesse como perceber olhos velhos indica uma relação já mais terna. Teresa tem um corpo jovem, mas seu olhar demonstra sofrimento e/ou sabedoria. A casca estúpida de Teresa é deixada de lado, a partir da segunda estrofe, pois o que se assinala então é o paradoxo da identidade da personagem.

Por fim, na terceira estrofe, o eu lírico capitula diante de Teresa. O terceiro encontro é recheado por magia (os céus se misturam com a terra) e milagre (Deus caminha sobre a água), por uma descoberta de sensações profundas, misteriosas e grandiosas. É o momento em que o eu lírico não enxerga mais nada, o que denota uma impotência diante da visão de Teresa, sua perda de poder de reação. Neste verso, por sinal, Bandeira parafraseia, implicitamente, o dito popular "O amor é cego". Impossibilitado de ver, cego àquilo que enxergava até então (os defeitos de Teresa), o eu lírico está realmente apaixonado.

A forma sintética de expressão do poema, estruturado em tercetos, é característica do movimento ao qual Bandeira se junta a partir do livro Libertinagem. O Modernismo se demarca pelo abandono das convenções literárias, pela busca da linguagem coloquial, livre, apoética até. No plano da expressão do poema Teresa, isso ocorre na estruturação livre (e excessivamente longa até, no caso do último verso da segunda estrofe, o qual, precisa ser alinhado abaixo do verso, com o sinal [ indicando que pertence ainda ao verso anterior) de todos os seus versos, do uso de versos brancos em todo o poema e da quase total ausência de figuras de linguagem na construção textual. O poema de Bandeira se manifesta poeticamente muito mais pela associação de elementos inesperados ("a cara parecia uma perna") do que pela percepção de uma beleza divinizada na mulher amada ou na existência. Esta percepção de poesia naquilo que menos se espera, nas fontes mais incomuns do prosaismo, do cotidiano, também é uma forma de manifestação do Modernismo no poema, visto que uma característica desta escola é justamente desmistificar a poesia e conectá-la à vida cotidiana e prosaica do ser humano comum.