31.3.07

Fichas de exercícios e revisão

Desculpem a ausência... 250 provas de redação me deixaram maluca nas últimas semanas. Além disso, algumas turmas se adiantaram, outras atrasaram e eu não podia atualizar isso aqui até conseguir organizar vocês.
Alguém mandou um comentário para mim pedindo uma revisão sobre Quinhentismo. Vou fazer melhor: vou fazer uma revisão de tudo e deixar junto com isso as respostas das duas fichas de exercícios, a sobre o Quinhentismo (cujos dois primeiros textos são um excerto da Carta de Caminha e a apropriação de Oswald de Andrade desse mesmo trecho no poema "As meninas da gare") e sobre Classicismo (com a ficha de exercícios sobre "Os lusíadas").

Quinhentismo e Classicismo
Como eu disse em sala, a denominação quinhentismo se conecta ao período histórico. Quinhentismo é a produção intelectual e cultural do século XVI, artística ou não. É por isso que, no Brasil, pode-se dizer que há Quinhentismo, pois há uma produção intelectual escrita nesse período. O que não há é o Classicismo, a produção artística fruto do Renascimento.

O Quinhentismo
Marcam os textos do quinhentismo, como vimos na ficha Confrontando textos - Ficha de Exercícios 1, o olhar sobre o índio e sobre a natureza. Esse olhar sobre o índio oscila entre a percepção de sua inocência, como acontece no Texto I da ficha, excerto da Carta de Caminha, e a malícia do colonizador (como Oswald, no século XX, manifesta em As meninas da gare).
Os exercícios dessa ficha, por sinal, baseiam-se nas relações de paródia e de paráfrase entre textos produzidos em épocas diferentes sobre esses mesmos dois assuntos primordiais da nossa literatura de informação do século XVI: o homem e a terra. Oswald, em seu poema, resgata e redimensiona a primeira impressão do homem português sobre o índio brasileiro, transformando as índias de Caminha nas prostitutas da estação de trem (gare é uma palavra francesa que significa estaçaõ de trem). A simples atribuição do título faz essa transformação total no texto, que ressalta os malefícios que a civilização européia traz ao Brasil (a prostituição e a miséria que ela representa). O avanço tecnológico existe (os trens), mas ele é pano de fundo, apenas, para a decadência do Brasil, que continua sendo usado pelo viajante, agora quase um turista sexual mesmo, turista de que o Brasil necessita para continuar sobrevivendo, assim como necessita da cultura européia (observe a necessidade do uso de uma palavra de língua estrangeira no lugar da língua portuguesa - ela denota uma influência fortíssima da cultura européia na nossa).
A natureza, no quinhentismo brasileiro, freqüentemente (para não dizer quase sempre) será exaltada em sua exuberância e na sustentabilidade que o homem tem ao se relacionar com ela. É o nosso pau-brasil que sustenta a colônia no século XVI e é o nosso solo cuja fertilidade o próprio Caminha já apontava na famosa Carta que sustentará o Brasil nos séculos seguintes: através do açúcar, do ouro (que também brota da terra), do café... Resgatando esta tradição temos os dois poemas do restante da ficha: À Ilha da Maré, de Botelho de Oliveira, escrito no século XVII, e Ladainha, de Cassiano Ricardo, escrito no século XX. Em ambos o nativismo (sentimento de apego à terra natal) é expresso através da exaltação da nossa fauna e da nossa flora, dos nossos animais e das nossas plantas. A diferença consiste na forma como cada autor fez esta exaltação: Cassiano Ricardo o faz através da repetição constante do refrão ( repetição que foram a ladinha do título), que se intercala com digressões mais profundas sobre os elementos que formam a nossa natureza e que vão mostram como o conhecimento sobre o Brasil foi sendo formado no século XVI. Botelho de Oliveira, por sua vez, faz uso de versos livres (sem métrica) com rimas emparelhadas e, no final do trecho que está na ficha, usa a disseminação e recolha com assimetria. A disseminação é o ato de espalhar os conceitos dos quatro AA na penúltima estrofe, que, segundo ele, são perfeitos. A recolha é a reordenação desses quatros AA na última estrofe. Esse processo foi feito com assimetria pela diferença na ordenação desse "espalhamento" e da recolha: o poeta espalhou numa ordem as palavras e recolheu em outra, provavelmente para manter o seu esquema de rima e possivelmente para ordenar os elementos pelo seu valor econômico.
Essas apropriações artísticas dos temas do Quinhentismo, como é fácil de perceber, resgatam muito da visão sobre o Brasil daquele período. A diferença fundamental, porém, é o fato de o fazerem através da criação de uma obra de arte, enquanto que o Quinhentismo brasileiro não constitui um movimento artístico. O primeiro movimento ocorrido aqui no Brasil vai ser o Barroco, no século XVII. Quanto ao primeiro movimento artístico de caráter brasileiro, puramente nacional, aí é outra complicação que nem os críticos mais gabaritados conseguiram resolver consensualmente ainda. São cenas dos próximos capítulos... Por enquanto, relaxem!

O Classicismo
O Classicismo é um movimento que nas artes manifesta a nova visão de mundo obtida com a revolução cultural que fez renascer a cultura greco-romana na Europa. Ou seja: é o Renascimento nas Artes.
Sendo parte deste movimento maior que é o Renascimento, o Classicismo compartilha com ele de seus conceitos: o antropocentrismo, a valorização da razão e da contenção emocional. Além disso, vai copiar os preceitos estéticos da arte greco-romana, os quais são transformados em modelos que precisam ser cumpridos para se atingir o belo. Na literatura isso aconteceu com a adoção das estruturas dos gêneros literários como se manifestavam na Grécia e em Roma, tanto na sua constituição lógica como na estética. No nosso estudo imediato nos interessa observar isso no resgate que Camões faz, na literatura portuguesa, do gênero épico.
A epopéia (poesia épica), como foi inclusive abordado na ficha "Os lusíadas - Analisando o texto", estrutura-se logicamente em proposição, invocação, dedicatória, narração e epílogo, sempre nessa ordem.
Na proposição, o artista informa qual será o tema de que ele tratará no texto: em Os lusíadas isso acontece nas duas primeiras estrofes, em que Camões informa que tratará da viagem de Vasco da Gama (toda a primeira estrofe diz isso), da história de Portugal (as memórias gloriosas / Daqueles Reis que foram dilatando / A Fé, o Império, e as terras viciosas / De África e de Ásia andaram devastando) e dos grandes mitos portugueses - que é o caso de Inês de Castro, por exemplo (aqueles que por obras valerosas / Se vão da lei da Morte libertando). Na invocação, o artista pede auxílio às Musas, pedindo que elas as inspirem a fazer um bom poema. Na Antigüidade Clássica, recorria-se a Calíope, a musa da poesia épica. Camões inova pedindo auxílio às Tágides, ninfas do rio Tejo, numa clara exaltação nacionalista (afinal ele prefere uma entidade mitológica que seja conectada à nação portuguesa, e não simplesmente uma entidade estrangeira). A invocação ocupa da terceira à quinta estrofe.
Na dedicatória, o artista oferece o poema a alguma figura importante, geralmente de importância política e financeira para ele (lembre-se do papel do mecenas na Idade Moderna). No caso de Os lusíadas, Camões elege como receptor da dedicatória o rei D. Sebastião. Essa estratégia deu certo: o rei decretou que deveria ser paga uma pensão a Camões enquanto ele vivesse. O problema é que aquilo que se decreta não é necessariamente o que se faz: o autor morreu na miséria. A dedicatória ocupa uma longa parte do primeiro Canto de Os lusíadas: na ficha, isso representa todas as outras estrofes do texto.

A narração contitui o contar a história, especificamente. Nela, Camões faz algumas inovações:
1 - Ao mesmo tempo em que exalta a própria nação, elemento constitutivo típico do gênero épico, ele toma liberdades poéticas que a criação literária permite para criticar o empenho conquistador de Portugal, através da fala do Velho do Restelo;
2 - Introduz os episódios líricos na epopéia: é o caso da morte de Inês de Castro e do lamento do Gigante Adamastor.

Sobre essas duas inovações, por sinal, tivemos três questões da ficha, as quais nos ajudaram a compreender melhor estes elementos. A primeira delas foi sobre Inês, descendente de uma família nobre na época da formação do Estado único português. Inês foi apaixonada pelo príncipe Pedro, filho de Afonso IV, e eles viveram um romance adúltero desaprovado pelo rei, que temia a influência dos Castro sobre o futuro regente português. Quando o príncipe Pedro, já viúvo, perde também o filho que teve com a princesa Constança, morta no parto, o rei Afonso teme que os Castro aproveitem a oportunidade para reclamar o trono através de um dos filhos de Inês e de Pedro. Por isso, manda matar Inês, que foi degolada por capangas num local conhecido hoje como Quinta das Lágrimas. Conta a lenda que a água que brota da fonte desta quinta é vermelha, como o sangue derramado de Inês.
Na narração da história portuguesa, Camões revive este episódio trágico da morte de Inês de Castro num dos pontos altos da obra. A ficha reproduziu um pequeno trecho em que um eu-lírico, que reflete sentimentalmente o mundo, fala sobre a morte de Inês. Para isso ele conversa com o sentimento amoroso e com Eros (Amor). Essa imagem pagã valoriza a cena da morte de Inês, que é comparada a um sacrifício a um deus tirano.

A fala do Velho do Restelo, assim como o Epílogo (conclusão da obra) são os momentos em que Camões toma liberdade para criticar Portugal. Hoje alguém me perguntou se chegam a constituir momentos líricos. Não exatamente. A fala do Velho do Restelo reproduz em discurso direto (sem a intervenção do narrador) a impressão negativa que o personagem tem sobre a conquista portuguesa, a qual, segundo ele, é movida pela cobiça, pela glória, pela fama. Não há um eu-lírico de quem escreve a obra Os lusíadas se manifestando nela (daí Camões conseguir se disfarçar com o personagem). Também não é o que ocorre no epílogo, já que o que caracteriza esta parte é justamente uma reflexão sobre o que foi narrado e isso constitui naturalmente a obra maior que é a epopéia. É diferente de, na narração, o autor deixar de lado o relato de guerras para contar a história de um amor e nessa história derramar-se emocionalmente no texto. Ou do texto de Fernando Pessoa, em que o poema tem o únco propósito de mostrar a reflexão de seu autor sobre a conquista portuguesa, sem se preocupar, nisso, em fazer uma narração.

O episódio do Gigante Adamastor é outro ponto de lirismo na obra. Infelizmente esse lirismo não pode ser percebido no trecho da questão 5 da ficha, pois ela tem como propósito principal trabalhar os conceitos de paráfrase e paródia. Nela se compara a personificação do cabo das Tormentas que fazem Fernando Pessoa e Camões. O momento lírico é posterior à apresentação do personagem, quando ele relata e lamenta seu amor impossível por Tétis, ninfa dos oceanos. Aí existe uma pausa na narração da história de Vasco da Gama, de novo, para que um novo narrador, este sim que se posiciona sobre o assunto, possa contar sua história e se posicionar sobre ela. Quando o Gigante Adamastor se transforma em narrador (enquanto o Velho do Restelo é apenas personagem) ele dá um caráter lírico, pessoal ao que narra. Ah... e sim, existe paráfrase, hamornia, nas duas caracterizações.

Bem, é isso. Boa prova segunda-feira e bom fim-de-semana!
Sejam felizes!

11.3.07

Camões, Os lusíadas e o Classicismo

Olá pessoas,

Desculpem a ausência na última semana, mas a correção de trabalhos (de vocês e dos meus outros 500 alunos) me mantiveram ocupada demais para postar aqui. Mas vamos lá...

Terminamos o estudo da literatura de informação com aqueles exercícios com o texto de Oswald de Andrade e com os textos de Botelho de Oliveira e Cassiano Ricardo... Menos a turma A, que não pôde, aindam, trabalhar com este material (mas que o fará em breve). Por essa discrepância eu vou pedir a vocês um pouquinho de paciência para eu postar as repostas aqui, mas não se preocupem, elas aguardarão vocês.

Em seguida, começamos o estudo desse mesmo período da literatura, mas em Portugal. Vimos, então, duas fichas teóricas sobre Camões e as turmas A, B e E já começaram a exercitar sobre o texto de Camões. Quem não começou ainda, é só aguardar a próxima aula. Quando terminarmos este material, eu deixo as resposta aqui, como sempre.

O que falar de Camões então? Muito vocês já descobriram nos trabalhos sobre o século XVI e muito nas nossas fichas teóricas. Estudamos em sala que, sendo representativo do Classicismo português, Camões se pauta em dois grandes autores da tradição clássica greco-romana para fazer seu poema: Homero e Virgílio. Estes dois autores e seus poemas épicos (epopéias) fundaram a tradição clássica que, no século XV foi resgatada inicialmente por Dante Alighieri, autor italiano, em A Divina Comédia, e, depois pelo próprio Camões, na literatura portuguesa.

Mas o que significa "resgatar a tradição da epopéia clássica"?

Na Grécia Antiga, os filósofos Platão e Aristóteles produziram as primeiras teses que embasam a teoria da literatura. Observando a produção de literatura de seu tempo, eles perceberam que poderia agrupar os textos em três categorias distintas, às quais chamaram gêneros literários. São eles: lírico, dramático e épico.

A distinção principal entre o primeiro dos dois últimos é o conteúdo. No gênero lírico, importa a apresentação de uma perspectiva, um sentimento, uma reflexão de um "eu" sobre o mundo. Daí vem a expressão "eu lírico". Já no gênero dramático e no gênero épico, importa a narração de eventos que mobilizam personagens. Estes dois gêneros, de conteúdo bastate semelhante, diferenciam-se na forma: o gênero dramático é feito para ser representado (e isso, na Grécia Antiga, significava ser a peça de teatro), enquanto o gênero épico contém um narrador que faz o relato da história.

Isso não significa, porém, que os textos de romances e contos que costumamos ler são parte do gênero épico. São, sem dúvida, textos de um gênero narrativo sim, mas não são, necessariamente, épicos. Um texto, para ser épico, precisa de um elemento essencial que outras produções narrativas não precisam ter: um herói modelo de civilização, cuja perfeição deve exortar o homem a ser melhor do que é.

Não entendeu? Então vamos fazer uma comparação só para ilustrar... Se pensarmos em séries de TV como OC e Smallville, veremos que em OC, os personagens, mesmo aqueles a quem admiramos, são pessoas comuns. Elas podem ser engraçadas, tristes, alegres, têm defeitos e qualidades e delas gostamos, mas elas não são nada além de humanas, com tudo o que um ser humano tem, principalmente os defeitos. Esse tipo de personagem é amado porque seu público se identifica com ele, percebe nele elementos que as pessoas no cotidiano também têm.

Já em Smallville, temos um herói bastante clássico. Clark Kent é bom filho, bom amigo e ainda encontra tempo para salvar o mundo. É um personagem altruísta, que prefere sofrer com a ausência de quem gosta a deixar a pessoa em perigo. Apesar de sofrer, ele sempre vai fazer aquilo que é certo, nem que para isso o seu tão importante segredo seja revelado. Ele tem poderes suficientes para dominar o mundo, mas é bom demais para deixar a ambição o dominar.

Esse exemplo de herói exemplar é que corresponde ao herói clássico (herói da literatura clássica grega e romana). Esse herói, para Platão, é que fazia com que as tragédias gregas e a epopéia fossem o gênero literário de maior valor, pois elas estimulariam os homens a serem melhores do que são, exaltando qualidades que todas as pessoas deveriam desejar desenvolver. Com o tempo, além desse componente de "estímulo ao indivíduo melhor", também se associou o componente de "tornar a nação melhor". Foi o que aconteceu na obra de Virgílio e na de Camões.

"Como assim?", você deve estar se perguntando. Vamos voltar um pouquinho ao que eu falei sobre as obras clássicas e adentrar na obra classicista portuguesa.

Nos poemas Ilíada e Odisséia, Homero se concentra em dois grandes heróis: Aquiles e Ulisses, que servirão de exemplo para o homem grego. Aquiles é o grande herói da guerra de Tróia (embora Ulisses seja o personagem que consegue determinar a vitória dos gregos). Ele é um semideus - e chegou a ser cultuado como Deus por algumas populações do mar morto - e, por isso, tem uma beleza olímpica (ou seja, divina, perfeita), um corpo perfeito, mais ágil, mais forte, mais resistente do que o de qualquer homem comum. E, como foi banhado pela mãe no rio Estige, é também imortal (exceto pelo famoso calcanhar, única parte que não foi banhada pela imortalidade). Em Aquiles, Homero exalta a grandiosidade do herói guerreiro, colérico e impiedoso, mas também demonstra que apenas a força não leva a vencer uma guerra. E nisso entra Ulisses.

Ulisses, ou Odisseu, era um homem comum, mas nem tanto: por ser rei e por ser ardiloso, inteligente, sagaz como nenhum outro homem grego. A guerra em Tróia não teria sido vencida pelos gregos não fossem os conselhos de Ulisses e o estratagema do cavalo de Tróia, por ele criado. Ulisses passou dez anos tentando regressar à Ítaca, seu reino, após tempo equivalente em guerra. Foi sua inteligência, paciência e persistência que o permitiram não só vencer Tróia e as dificuldades criadas por Netuno para seu regresso como também reassumir seu trono.

Com Aquiles e Ulisses, Homero demonstra as duas principais qualidades desejadas pelos homens gregos: bravura e inteligência. Não há, porém, um compromisso nacional com esses elementos, pois as obras não têm a intenção de fazer propaganda nacionalista. É o que distingue, principalmente Ilíada e Odisséia de Eneida.

O poema de Virgílio, como está informado na ficha de vocês, foi encomendado pelo imperador romano Augusto, para que uma obra romana, contando a origem de Roma, superasse a memória das obras gregas e alçasse Roma a um patamar superior na memória da Antigüidade. Daí Virgílio faz o resgate de Enéias, guerreiro troiano sobrevivente da invasão dos gregos, que lidera os troianos por anos de navegação e batalhas até conseguirem se estabelecer na península Itálica e fundar a cidade que originou Roma. Enéias, o herói, além de grande guerreiro é um homem religioso, que se submete aos deuses. A ele, então, são associadas as duas grandes qualidades do homem romano, e que todos os romanos deveriam ter: bravura para a guerra e submissão religiosa aos desígnios dos deuses - qualidade que se associa à piedade e à justiça.

Como os heróis clássicos são homens incomuns, que estão em um nível se evolução superior, também o herói classicista precisa estar. Daí Camões resgata Vasco da Gama: grande navegador, grande guerreiro, homem justo e cristão. Vasco da Gama vai personificar todo o ideal de perfeição de um homem português em Os lusíadas: bravura (contra o mar e as guerras) e submissão religiosa. Bastante parecido com Enéias, não é verdade?

Sim e não é à toa essa semelhança, dada a imitação de modelos que caracterizam o Classicismo e que acompanham não apenas o conteúdo, mas também a estrutura dos textos. Essa estrutura-modelo se divide em duas partes:

Estrutura lógica:
São as partes lógicas do relato, semelhantes à introdução, desenvolvimento e conclusão que vocês estudam em produção de texto. À introdução correspondem as três primeiras partes lógicas da epopéia: proposição, invocação e dedicatória. Ao desenvolvimento corresponde à narração e à conclusão o epílogo.

Entenda melhor: uma introdução, em um texto dissertativo, apresenta o tema que será discutido e a abordagem dessa discussão. Na epopéia a proposição indica o tema a que o poeta se propõe a desenvolver; a invocação é a solicitação do apoio das musas (e das ninfas, em Camões) para que o poema seja bem feito; a dedicatória é o oferecimento do texto a alguém importante.

Já o desenvolvimento apresenta os argumentos que justificam o ponto de vista defendido no texto. O equivalente a isso, no texto narrativo, é a própria narração em si.

Por fim, a conclusão, em um texto dissertativo, é a demonstração final da tese, do que pensa o autor sobre os argumentos expostos. Camões também faz essa avaliação final no epílogo, mas